A dor israelita será sempre preferida ás bombas palestinianas porque os carros ficaram brancos pela seda da neve que caiu sem ninguém esperar, porque raramente dois pares de lábios cristalizam assim
- num toque de tempo que se faz momento
um momento estático para análise num determinado espaço
numa determinada posição
numa determinada organicidade que se quer perceber.
- porque nós os dois não estamos assim, eu não estou na nossa cama despida-sentada e tu não estás de pé para ires vestido, tu não estás de pé de costas para mim, para mim sentada :
eu não estou triste a querer dar-te beijinhos nas costas que pedissem desculpa por mim
(os beijinhos pequenos nas costas têm efeitos curativos milenares e ninguém sabe)
a querer que me deixes aninhar em ti porque o teu corpo é o resto do meu
é a continuação do meu
é o fim do meu.
Há alguém que nos quer congelar os lábios para nos microscopiar, para nos pormenorizar, para nos entender, para nos ver aqui na nossa cama onde fazemos amor com o tempo lá fora, ás escondidas dos outros
(nós, o nosso corpo e o tempo lá fora)
e ontem, ontem depois de nós contaram-me o fim da estória de amor que te falei por alto: a estória de amor da mousse de manga do frigorífico e uma mulher que sabia que a mousse lá estava.
Foi ontem que me contaram,
foi ontem que me disseram
que a mousse de manga recusou a boca que a havia querido por pertença.
A mousse de manga, ao contrário do previsto, atirou-se ao chão na recusa daquilo que sabia que se ia cumprir através dela, no ritual de alimento
(a boca a alimentar rejeitada pelo alimento)
mas a travessa de mousse ganhou vida própria e preferiu a aniquilação.
A mousse de manga deixou de amar.
O desejado deixou de se querer desejar.
Há teorias possíveis que me levam a suspeitar que esta mousse de manga entrará num ciclo de vida budista e renascerá como mulher.
Uma linda mulher com um respeito de solenidade por todas as mousses de manga em frigorificos com mais de 1 mês que esperam
- que esperam
que anseiam gélidas a colher que as ame como alimento sagrado de dádiva divina; a colher certa que as engorde e as faça felizes.
A felicidade sabe a mousse de manga.
Os lábios?
Juntos, quem sabe se não pela eternidade.
terça-feira, fevereiro 07, 2006
logic is the ruin of the spirit
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