A minha família
na minha família somos três, ou melhor três e meio porque a mamã está grávida e eu vou ter o meu primeiro irmão daqui a dois meses.
eu não sei o que escrever na composição que a professora mandou fazer porque é o meu pai que me ajuda nos deveres mas ele hoje foi por música a uma bar e a mamã está a fazer o jantar na cozinha e diz só poder ajudar-me cinco minutos.
a mamã escreve coisas, dá aulas e tratada de mim e da barriga dela que agora parece uma melancia.
ela conheceu o meu pai numa discoteca chamada Lux e diz que já nesse altura já sabia que ele tinha mau feitio.
ela contou-me que a parte dessa discoteca que ela preferia era o estacionamento porque foi ai que o papá a beijou pela primeira vez quando ele tinha um micra vermelho, num tempo em que a mamã usava um só brinco, mini saias muito curtas e a minha avó marcava horas para ela chegar a casa.
o meu pai diz que gostou dela assim que a viu entrar zangada no carro dele por ele ter chegado tarde.
eu acho que eles gostam muito um do outro porque na semana passada eu entrei na cozinha e eles estavam abraçados a dançar descalços sem música como se a aparelhagem estivesse ligada.
às vezes o meu pai passa pela minha mãe morde-lhe o rabo e chama-lhe amor.
aos sábados à noite o meu pai deixa-me na minha avó e só me vem buscar para irmos todos almoçar fora no domingo:
eu perguntei à minha avó porque é que eles queriam ficar sozinhos tanto tempo e ela disse-me que era para namorarem.
pergunto-me porque motivo não podemos namorar os três como fazemos aos sábados de manhã quando eu vou para a cama deles e o meu pai me morde a barriga para me fazer rir.
o papá gosta da minha avó mas ela plantou coisas no nosso quintal e o papá tem de regá-las aos sábados e diz que não tinha nada de regar as coisas que ele não planta.
no fim-de-semana veio a tia Zuleika do Algarve para nos apresentar o 26ª namorado definitivo.
a minha mãe disse que ele era giro e eu também achei mas acho que o papá é o mais giro dos 26 e a mamã disse que era normal, que eram as teorias de Freud a funcionar em mim e eu não percebi nada.
O meu quarto é cor-de-rosa e a minha mãe pintou uma lua amarela no tecto para eu ter sonhos lá na lua:
à noite a mamã vem sempre à minha cama às escuras e eu finjo sempre que durmo, e ela dá-me um beijinho puxa a roupa e diz ao ouvido que me ama mesmo achando que eu durmo.
ontem à tarde estavamos a vir da minha escola e eu perguntei-lhe se ela sabia que eu também a amava porque eu nunca tinha ido ao quarto dela puxar-lhe a roupa beijá-la e dizer-lhe ao ouvido que a amava quando ela dorme:
eu não sei se ela dorme ou finge que dorme como eu.
a minha mãe parou o carro de repente e abraçou-me.
eu assutei-me e os carros atrás do nosso apitaram e ela disse que eu podia dizer-lhe que a amava a toda a hora porque dizermos ás pessoas que as amamos faz o nosso coração ficar grande e bonito e a minha mãe diz coisas estranhas às vezes mas eu tenho medo que o meu coração seja como o chupa de morango que eu estou a comer antes do jantar sem autorização:
será que quando amamos muito alguém sobra mais alguma coisa para outra pessoa?
eu amo o João António da 5 ª classe, fiz-lhe o desenho do meu coração a vermelho e dei-lho mas ele diz que eu sou uma miúda pequena e eu senti-me tão mal que fingi desmaiar só para o ver aos meus pés preocupado.
a minha mãe foi à escola buscar-me e eu contei-lhe tudo quando ainda estava deitada no gabinete de enfermagem e ela disse-me que às vezes acontece darmos o nosso coração às pessoas erradas
(ela disse-me que todos os homens são uns cães e eu pensei que espécie de cão o papá seria)
mas que haverá um dia em que alguém vai querer o meu coração de verdade e eu vou ser tão feliz como ela é com o papá e quando ela me disse que havia mousse de chocolate para o jantar eu senti-me logo melhor para ir para casa.
Ela riu-se e disse-me ao ouvido que achava que eu ia ser uma óptima actriz daqui a 15 anos mas não sei se ela tem razão nisso porque eu sempre quis mesmo ser uma boa veterinária.
4 comentários:
Há sempre o outro lado da moeda, essa é a historia da menina feliz.. agora podias explorar o lado da menina infeliz.
Adoro os teus textos.
beijo *Maria*
O outro lado da história fala de alguém que escreve sobre tudo o que a rodeia porque têm uns olhos que devoram um mundo.....e as pessoas.
(se você fosse gajo eu comia-o :P)
adoro-te ....não te percas
keep being stupid :)
Sandra
tão krido! é tão bom poderes conseguir recuperar a visão infantil do mundo, nem que seja a fingir... nem que seja por um bocadinho... eu tenho tentado mas não sai nada tão puro. parabéns
Antes demais, Obrigado pelo comment no meu blog...
Só nao comentei no ultimo post teu porque pus-me a ler e gostei mais deste texto do que qualquer outro... Para ser sincero, gostei tanto do conceito, que estou a pensar em fazer o mesmo, por isso passa por lá daqui a uns tempos e quem sabe...
Em todo o caso, fica bem!
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