segunda-feira, agosto 09, 2004

Open fire


(...) Desfazer cascas de ovos com a ponta dos dedos, imaginá-los picados, magoados, com sangue, e lembrar-me de pratos de cerelac feitos em massa numa mesa grande de madeira,

- bebés, pois sim

imaginá-los todos, alimentados, felizes, a rir.

É chá quente para uma mulher magra, selecta, sentada numa cadeira.
Esta mulher aqui, de cabelo meio grisalho, elegante, não se entende com o corpo desde o dia em que nasceu.
Não se masturba e come pouco.
Um marido. Um filho: resultado estrábico duma primeira noite a cumprir entre lençois de linho brancos e sangue virginal.
O milagre da concepção é tão fodido como o amor.

- os bebés, os das linhas de cima,
brincam num pátio,
oiço-os a rir.
O riso próprio de quem só tem dois dentes na frente e um babete sempre me arrepiou.
Oico-os desde o momento em que acordei hoje

É esta mulher que vos falo, a do chá, a do único filho médico, e do marido da única noite já morto,

- já vos disse que o marido dela ia ás putas?


Vou ter de interromper o texto.
Os bebés. Eles, os das linhas de cima. A mulher do chá.O sangue virginal, o filho dela.
Os bebés? Ainda. O riso. A minha cabeça.


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